Salvaguardar as Bibliotecas

Uma biblioteca é uma casa do tesouro do conhecimento e um pilar da liberdade de pensamento.
Em tempos de paz e prosperidade, podemos não compreender o verdadeiro significado de uma biblioteca mas se recorrermos à história ficaremos a saber que as bibliotecas têm sido lugares de importância estratégica para os estrategas militares desde a antiguidade. 
Quando o primeiro imperador Qin unificou a China, ordenou que os livros fossem queimados e os académicos confucionistas aniquilados para destruir todos os registos históricos, excepto aqueles escritos por historiadores Qin, e livros que satirizavam a política contemporânea da época. Quando Júlio César ocupou Alexandria no Egipto, mandou incendiar a maior biblioteca do mundo da época – a Biblioteca de Alexandria. Durante a II Grande Guerra Mundial, a famosa biblioteca da Universidade Católica de Leuven foi incendiada quando os alemães invadiram esta cidade. 
Desde tempos imemoriais que numerosas colecções preciosas de livros têm perecido em guerras, por isso é nossa responsabilidade proteger as nossas bibliotecas e permitir que o conhecimento e a sabedoria sejam passados de geração em geração.  
Ao longo dos anos, entre aqueles que serviram como guardiães de bibliotecas durante as guerras, incluem-se não só figuras proeminentes na arena cultural mas também personalidades anónimas. Todos foram movidos pela mesma vontade de preservar uma fundação cultural dos seus locais amados. 

Um Tributo aos Guardiães

//Biblioteca Nacional de Beiping foi salvaguardada por Cai Yuanpei .

Cai Yuanpei
O antigo reitor da Universidade de Pequim, Cai Yuanpei, demonstrou excelência na administração da biblioteca da Universidade de Pequim e em 1929 assumiu o cargo de Director da Biblioteca Nacional de Beiping (agora uma dependência da Biblioteca Nacional da China), que foi a biblioteca mais moderna da época no Extremo Oriente. 
Na sequência do incidente de Mukden, as três províncias do nordeste da China foram tomadas pelo Japão e todos os livros existentes nestes locais caíram nas mãos do inimigo. A Associação de Bibliotecas da China, solicitou então ao Ministério da Educação do Governo Nacional para dar ordens às bibliotecas para se prepararem para uma emergência e, se necessário, enviar os livros raros para locais secretos. Cai Yuanpei enviou, assim, em privado,  as importantes colecções da Biblioteca Nacional de Beiping para as concessões britânica e americana em Xangai. 
Após o incidente da Ponte Marco Polo, Beiping (actualmente Beijing) foi invadida pelas forças japonesas e Cai Yuanpei refugiou-se em Hong Kong, onde faleceu de doença em 1940. Mais tarde, a Biblioteca Nacional de Beiping foi tomada pelos japoneses mas felizmente Cai Yuanpei tinha já enviado as colecções importantes para Xangai, das quais os livros antigos de elevado valor foram mais tarde enviados em privado para os Estados Unidos pelo director substituto da biblioteca na época, Yuan Tongli, e depositados na Biblioteca do Congresso dos EUA. Em 1965, o conjunto de colecções foi devolvido ao Partido Nacionalista em Taiwan.

Saad Eskander
Director da Biblioteca e Arquivos Nacionais do Iraque (INLA), Saad Eskander estudou no Reino Unido. Após a queda da administração de Saddam Hussein em 2003, foi recrutado pelo Governo Interino do Iraque como Director da Biblioteca e Arquivos Nacionais do Iraque, como responsável pela reconstrução da biblioteca, a qual tinha sido danificada durante a guerra Irão-Iraque e durante as invasões levadas a cabo pelo Reino Unido e pelos Estados Unidos da América. 
Quando Saad Eskander tomou conta da direcção da biblioteca, 60% da documentação, 25% dos livros e 90% dos mapas e das colecções de fotografias tinham sido pilhadas, enquanto o mobiliário tinha sido roubado ou queimado. No meio de tiroteios e balas e de abastecimento de energia instável, liderou 400 bibliotecários na reconstrução da biblioteca, passando por vários anos de dificuldades para completar a tarefa. 
A partir de Novembro de 2006, Saad Eskander escreveu o diário do trabalho de reconstrução no seu blogue, que foi publicado nos sítios web da Sociedade de Arquivistas e da Biblioteca Britânica. O diário, escrito ao longo de nove meses, chamou a atenção do mundo exterior, que se propôs oferecer ajuda. Por exemplo, a Biblioteca Britânica doou ao Ministério dos Negócios Estrangeiros cópias reduzidas dos arquivos relacionados com o Iraque de 1914 a 1924; bibliotecas universitárias inglesas doaram um total de 300 livros e o Reino Unido, a Itália e a Holanda doaram equipamento à biblioteca.  

Alia Muhammad Baker
Antes da invasão do Iraque pelos Estados Unidos em 2003, Alia Muhammad Baker, Directora da Biblioteca Central de Basra, uma das maiores metrópoles no sul do Iraque, pediu ao governo local para deslocar todas as colecções de livros, o que foi recusado. No entanto, estava determinada a retirar em privado estas colecções por si própria.  
Primeiro, escondeu vários livros debaixo das suas roupas, levando-os para casa após o trabalho sem os seus colegas darem por isso. Mais tarde, pediu a um amigo dono de um restaurante situado ao lado da biblioteca, apenas separado desta por uma parede de 1m, que recebesse os livros que lhe ia passando pela parede. À noite, levava os livros para casa de carro.  
Basra foi tomada pelo Reino Unido e a biblioteca foi incendiada mas Alia Muhammad Baker já tinha retirado mais de 70% das colecções, salvando com sucesso 30,000 livros, incluindo uma biografia do Profeta Maomé datada de 1300. As suas acções inspiraram dois fabulosos livros infantis, um ilustrado e outro de banda desenhada. A biblioteca foi reconstruída em 2004 e Baker continuou a exercer o cargo de Directora, revertendo parte dos lucros da venda dos dois livros infantis para a biblioteca.

//Alia Muhammad Baker salvaguardou setenta por cento das colecções da Biblioteca Central de Basra durante a guerra.

烽火守書人: 伊拉克國家圖書館館長日記

▸ 烽火守書人: 伊拉克國家圖書館館長日記

Autor:薩德.伊斯康德 (Saad Eskander)

Tradutor:李靜瑤、張桂越

Editora:網路與書

Data de Publicação:2008

名人與圖書館

▸ 名人與圖書館

Autor:徐鐵猊

Editora:國家圖書館

Data de Publicação:2008

Library: An Unquiet History

▸ Library: An Unquiet History

Autor:Matthew Battles

Editora:W.W. Norton

Data de Publicação:2005

The Librarian of Basra: A True Story from Iraq

▸ The Librarian of Basra: A True Story from Iraq

Autor:Jeanette Winter

Editora:Harcourt

Data de Publicação:2005

Alia’s Mission: Saving the books of Iraq

▸ Alia’s Mission: Saving the books of Iraq

Autor:Mark Alan Stamaty

Editora:Alfred A. Knopf

Data de Publicação:2004

The Camel Bookmobile

▸ The Camel Bookmobile

Autor:Masha Hamilton

Editora:HarperCollins

Data de Publicação:2009

Biblioburro: A True Story from Colombia

▸ Biblioburro: A True Story from Colombia

Autor:Jeanette Winter

Editora:Beach Lane Books

Data de Publicação:2012

Creating Room to Read: A Story of Hope in the Battle for Global Literacy

▸ Creating Room to Read: A Story of Hope in the Battle for Global Literacy

Autor:John Wood

Editora:Viking

Data de Publicação:2013

Que o cheiro dos livros seja levado suavemente pelo ar!

Os guardiães de bibliotecas não têm que lutar na frente de batalha mas é-lhes confiada a disseminação dos livros por toda a parte. Através da história, muitos apreciadores de livros traduziram e implantaram o conceito de biblioteca de meios diferentes em locais pouco desenvolvidos e remotos   


//A história sobre a Biblioteca de Camelos do Quénia é contada por muitas pessoas, e acabou por dar lugar a um romance e a um documentário (Foto: Biblioteca Central do Quénia)

Biblioteca de Camelos 
Nos desertos do Quénia, num país africano que faz fronteira com a Somália, há um grande número de nómadas que se movem frequentemente de um sítio para outro aguardando a chegada de três dromedários que carregam livros para o deserto. Trata-se do muito conhecido conceito da biblioteca de camelos africana. 
A organização Book Aid International tem apoiado os serviços da Biblioteca Nacional do Quénia desde 1965, com três caravanas de camelos lideradas por um pastor de camelos e um bibliotecário. Cada caravana carrega cerca de 200 livros, uma tenda, um tapete de leitura e uma pequena mesa e quatro cadeiras, oferecendo serviços de empréstimo nas remotas e desoladoras aldeias do Quénia. Quando a caravana regressa, os aldeãos podem pedir emprestados mais livros desde que devolvam os que requisitaram anteriormente. Se algum dos livros não for devolvido, a caravana não regressa ao local. 
O romance famoso Camel Bookmobile da jornalista americana Masha Hamilton foi escrito com base neste conceito. Conta a história de um bibliotecário de Nova Iorque que aspira a mudar a vida das pessoas através do conhecimento, viajando para Mididima no Quénia para fundar uma biblioteca itinerante. Depara-se com numerosas dificuldades devido à cultura conservadora das tribos tradicionais e deixa-se enredar num conflito de sonho e realidade quando dois dos livros emprestados desaparecem.    

Biblioburro
Numa aldeia de montanha no norte da Colômbia, um país da América do Sul, um grupo de crianças esperava alegremente a chegada de um burro pois o dono do animal, Luis Soriano, iria trazer-lhes livros e contar-lhes histórias.
O professor primário Luis Soriano era fascinado pela leitura desde criança e descobriu que contar histórias era o melhor remédio para crianças que vivem em conflitos intensos. Chamou Alfa e Beta aos seus dois burros, que transportavam 70 livros da sua colecção pessoal, e partiu de casa com um letreiro onde se lia a palavra “Biblioburro” para levar livros às crianças das zonas montanhosas.’
Durante as suas viagens, perdeu alguns livros que não lhe foram devolvidos e deparou com bandidos que o tentaram roubar mas que descobriam que só trazia livros consigo. Quando a sua história se tornou conhecida, muitas pessoas de todo o mundo lhe doaram livros, enriquecendo as colecções do Biblioburro. 
A história lendária de Luis Soriano foi mais tarde contada num livro ilustrado.  


//Luís Soriano teve um papel importante na criação da Biblioburro e tornou-se um mestre de livros ilustrados para crianças.

Room to Read (Espaço para Ler)
Antigo executivo da Microsoft na Ásia, John Wood viajou para o Nepal de férias em 1998 onde viu, numa escola situada numa zona montanhosa, um grande número de crianças acotovelando-se para partilhar um livro. Constatou também que a biblioteca da escola não tinha livros. Antes do final da sua viagem, foi inspirado a pedir à família e amigos para doarem livros, aos quais enviou um email a partir de um internet café em Kahtmandu, a capital do Nepal. Um ano depois, regressou à escola com 3000 livros.
Pouco depois, abandonou o seu cargo executivo na Microsoft e regressou ao Nepal para se dedicar à promoção e à popularização da leitura. Em 2001, fundou uma organização não-lucrativa Room to Read, a qual não apenas enriqueceu as bibliotecas locais com as doações de livros mas criou também novas bibliotecas e mesmo uma editora de livros para crianças em inglês e nepalês.  
Até hoje, Room to Read criou mais de 10000 bibliotecas em dez países em vias de desenvolvimento na Ásia e em África e publicou mais de 1000 livros infantis nas línguas nativas. No ano passado, John Wood escreveu um livro sobre as histórias de Room to Read, revertendo todos os lucros para esta organização.


//“Espaço para Ler” implementado na África do Sul,tem sido muito bem recebido pelas crianças(Foto: Wilfredo Pascual)


//“Espaço para Ler” no Camboja (Foto: Susie Cushner)